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A Reforma Tributária e as Organizações Sociais Culturais: Detalhando os Impactos e as Reduções na Carga Tributária

  • Writer: Luz e Ferreira Advogados
    Luz e Ferreira Advogados
  • Jul 8
  • 5 min read

Updated: Aug 13

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A Reforma Tributária brasileira, aprovada e em fase de regulamentação, representa uma mudança sísmica no sistema de impostos do país. Para as organizações sociais, especialmente aquelas dedicadas à rica tapeçaria da cultura nacional e que frequentemente utilizam mecanismos como a Lei Rouanet, compreender os efeitos dessa transformação é crucial. O objetivo central da reforma é simplificar o emaranhado de tributos sobre o consumo, instituindo a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em nível federal e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) para estados e municípios, em substituição ao PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS.

Referidas alterações possuem impactos tanto em âmbito federal como estadual e municipal, na medida em que o novo imposto (IBS) possui hoje uma previsão específica pela qual não serão concedidos incentivos ou benefícios financeiros ou fiscais em sua base, modificando-se nesse caso as hipóteses de incentivo do ICMS e ISS eventualmente existentes hoje.

Portanto, a reforma impõe aos entes públicos e aos principais atores das atividades científicas, artísticas, culturais, religiosas e de assistência social, o redesenho do adequado e justo fomento devido às atividades do Terceiro Setor que são fundamentais para desenvolvimento social do país.



1. Um Novo Cenário Tributário para a Cultura: Redução Específica na Carga Tributária


Uma das alterações mais significativas e positivas para o setor cultural é a instituição de um tratamento tributário favorecido. A legislação da reforma estabelece uma redução de 60% nas alíquotas padrão da CBS e do IBS que incidirão sobre uma gama de atividades e produtos culturais. Isso inclui:

  • Ingressos para eventos artísticos, culturais e esportivos.

  • Produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais.

  • Direitos autorais e de imagem.

  • Atividades desportivas.

É importante frisar que a alíquota padrão geral do IBS e da CBS ainda será definida por lei complementar, buscando manter a carga tributária global atual em um primeiro momento, sem prejuízo da capacidade de cada ente federativo fixar a sua própria alíquota, que poderá não estar vinculada à de referência estabelecida pela Lei Complementar.

A redução de 60% será aplicada sobre essa futura alíquota padrão. Por exemplo, se a alíquota padrão combinada do IBS/CBS for hipoteticamente fixada em 25%, as atividades culturais beneficiadas pagariam apenas 10% (ou seja, 40% da alíquota padrão, representando uma redução de 60%). Esta medida visa diminuir o peso dos impostos sobre o consumo para o setor, fomentando sua produção e acesso.

A transição para este novo sistema será implementada gradualmente, entre 2026 e 2033. Durante esse período, as organizações culturais precisarão se adaptar às novas regras fiscais e monitorar a aplicação efetiva dessas alíquotas reduzidas.



2. Imunidades e Regimes Específicos para Organizações Sociais: A Busca pela Manutenção da Carga Zero em Casos Específicos


As organizações sem fins lucrativos, que formam a espinha dorsal de muitas iniciativas culturais e sociais, tradicionalmente contam com imunidades tributárias. A Reforma Tributária, em sua essência, busca preservar essas garantias constitucionais.

Para as entidades de educação e de assistência social sem fins lucrativos que atendam aos requisitos legais e possuem a certificação CEBAS, a reforma prevê a manutenção da imunidade completa em relação à CBS e ao IBS sobre suas receitas relacionadas às finalidades essenciais. Nestes casos, a redução da carga tributária do IBS e da CBS é total (100%), ou seja, a alíquota efetiva é zero para essas operações.

Espera-se que muitas organizações sociais culturais, dependendo de sua natureza jurídica, atividades e enquadramento nos critérios a serem detalhados em lei complementar, venham a se beneficiar de regimes específicos que visem a desoneração de sua carga tributária. Para estas, o impacto da CBS e do IBS seria nulo em suas atividades principais, representando a maior redução de carga possível. 

A clareza sobre o alcance total desses benefícios para o setor cultural, contudo, ainda não está definido e depende de normativas futuras.



3. O Futuro da Lei Rouanet e dos Incentivos Fiscais Federais


A Lei Rouanet, um pilar do financiamento cultural no Brasil, opera através de incentivos fiscais vinculados ao Imposto de Renda (IR). A Reforma Tributária atual foca primariamente nos tributos sobre o consumo (PIS, Cofins, ICMS, ISS, IPI). A intenção manifestada pelo governo e pelos legisladores é de que os incentivos fiscais federais, como a Lei Rouanet, sejam mantidos.

No entanto, o ambiente para esses incentivos pode sofrer influências indiretas. Não obstante, diante das limitações já expressas acerca de incentivos fiscais baseados no IBS e CBS, espera-se que a Lei Rouanet e demais mecanismos de fomento à cultura sejam reforçados e aperfeiçoados, como mecanismo de manutenção dos incentivos estatais.

A definição das regulamentações complementares será crucial para entender o equilíbrio entre a arrecadação e o incentivo às atividades culturais via Imposto de Renda nos próximos anos.



4. Desafios com Incentivos Estaduais e Municipais


Um ponto de atenção considerável é o destino das leis estaduais e municipais de incentivo à cultura que são baseadas no ICMS e no ISS. Com a extinção desses impostos e sua substituição pelo IBS (de competência compartilhada entre Estados e Municípios), a base legal para muitos desses incentivos regionais deixará de existir. Isso pode representar um vácuo no financiamento de projetos culturais locais, exigindo novas formatações de apoio por parte dos entes subnacionais.

Será de fundamental importância a participação das organizações sociais e associações representativas do terceiro setor nas discussões sobre a regulamentação da nova normativa, como forma de assegurar um olhar atento do legislador para esse setor.



5. A isenção do imposto sobre doações (ITCMD) para as instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social.


Um dos aspectos positivos e de importância para as entidades do terceiro setor refere-se à isenção sobre as doações recebidas para aplicação na consecução de seus objetivos sociais, benefício hoje inexistente.

Os desafios são importantes, como a definição da interpretação acerca da “relevância pública e social”. Sem prejuízo, essa isenção deverá ser objeto de disciplina específica em lei complementar, em discussão no Congresso Nacional no PLP nº 108/2024 e que contribuirá de maneira substancial para a viabilização de atividades essenciais dessas organizações. 



6. Impactos Operacionais e a Necessidade de Adaptação


Apesar da promessa de simplificação a longo prazo, a transição para o IBS e a CBS exigirá um esforço de adaptação por parte das organizações sociais culturais:

  • Revisão de sistemas: Softwares de gestão financeira e contábil precisarão ser atualizados para lidar com a lógica não cumulativa do IBS e da CBS (crédito do imposto pago na etapa anterior).

  • Capacitação: Equipes financeiras e administrativas necessitarão de treinamento para compreender e aplicar as novas regras de apuração e recolhimento.

  • Acompanhamento regulatório: Será fundamental monitorar as leis complementares e normativas infralegais que detalharão o funcionamento do novo sistema.

Existem também preocupações específicas, como o enquadramento de setores como o de jogos eletrônicos, que, apesar de reconhecidos pela Lei Rouanet, aguardam clareza sobre seu tratamento específico nas novas regras do IBS/CBS para atividades culturais.



Conclusão: Um Horizonte de Oportunidades e Vigilância Necessária


O Terceiro Setor possui alta relevância não apenas social e cultural, mas também sob o aspecto econômico. Pesquisa titularizada pela Sitawi estimou que em 2022 o Terceiro Setor teria contribuição de R$ 423 bilhões de reais para o PIB brasileiro, além disso, é responsável pela geração de mais de 5% dos empregos no Brasil.

A Reforma Tributária acena com perspectivas positivas para as organizações sociais culturais, notadamente pela redução de 60% na alíquota padrão do IBS/CBS para diversas atividades do setor e pela manutenção das imunidades para entidades sem fins lucrativos (que pode significar alíquota zero para muitas). A sinalização de continuidade da Lei Rouanet também é um alento.

Contudo, o período de transição demandará atenção, planejamento e adaptação. A efetivação dos benefícios dependerá da regulamentação detalhada e da forma como as questões em aberto, como o futuro dos incentivos subnacionais e o impacto indireto nas empresas patrocinadoras, serão endereçadas. Para as organizações sociais culturais, o momento é de se informar, preparar-se e participar ativamente das discussões para garantir que o novo sistema tributário fortaleça, de fato, a produção e o acesso à cultura no Brasil.


Por Matheus Mendanha, Advogado Tributarista no Luz e Ferreira Advogados e Heitor Ferreira, sócio e Advogado Tributarista no Luz e Ferreira Advogados. 

 
 
 

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