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Compliance Trabalhista nos Contratos com a Administração Pública

  • Writer: Luz e Ferreira Advogados
    Luz e Ferreira Advogados
  • Aug 13
  • 8 min read

Updated: Nov 3


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Compliance


A etimologia da palavra compliance vem do latim “complere”, em português podemos entender como “à vontade de fazer o que foi pedido, ou se agir ou estar em concordância com as regras, normas e condições”.


Neste sentido, temos que na língua inglesa “to comply” significa “cumprir, executar, satisfazer, realizar o que lhe foi imposto”.


No Brasil o termo “compliance” passou a ser mais utilizado e conhecido com o início da vigência da Lei n.º 12.846/2013, a qual inseriu no ordenamento pátrio a responsabilização civil e administrativa de empresas, fundações e associações com relação aos danos/prejuízos causados ao Erário Público em razão das condutas de seus empregados/colaboradores ou representantes.


Assim, a previsão de responsabilização das pessoas jurídicas de forma objetiva (independente de culpa) pelos atos de corrupção (que representem benefícios para as empresas) de seus empregados e representantes desencadeou à adoção de medidas para redução das sanções, entre elas a mais comum denominada “Programa de Compliance”.


Vale dizer, em que pese todas as particularidades de cada serviço, bem como do próprio modelo de negócio de cada empresa, a mera adoção de um Programa de Compliance não exime as responsabilidades das empresas.


Corroborando o exposto, nos ensina Flavio Carvalho Monteiro de Andrade:


“A propósito, a imagem da organização vem sendo cada vez mais considerada como algo inerente e indispensável à sua sustentabilidade, algo que pode levá-la ao sucesso ou ao fracasso, e o compliance vem sendo visto nesse cenário como um dos mais relevantes mecanismos de proteção à imagem e à reputação da organização perante os stakeholders em geral, pois tem o poder de evitar atos que possam gerar danos, ao melhorar os índices de cumprimento de normas internas e estatais. ”(ANDRADE, 2017, p. 74)


Outrossim, a Lei Anticorrupção n.º 12.864/2013 ao prever a aplicação de sanções para empresas envolvidas em atos de corrupção, estabelece como atenuantes das penalidades, à adoção de programas de integridade (Programa de Compliance).


O Decreto 8.420/2015 ao regulamentar os pilares básicos para adoção de um Programa de Compliance efetivo, lista como fundamentais (denominados pilares básicos): “o suporte da alta administração, avaliação de riscos, Código de conduta e políticas de Compliance, controles internos, treinamento e comunicação, canais de denúncia, investigações internas, due diligence, auditoria e monitoramento”.


Ademais, referido decreto preconiza critérios para cálculo de multa, regras para celebração de acordos de leniência, disposições acerca de listagem de empresas que sofreram punições e premissas para avaliação da efetividade dos programas de integridade.

Desta forma, para que o Programa de Compliance adotado pelas pessoas jurídicas seja efetivo, é necessário respeito e atendimento ao modelo de negócio da organização e principalmente que tenha como foco à adoção de medidas de prevenção, controle e adequação ao ordenamento jurídico para mitigar as responsabilidades previstas na legislação.



Compliance Trabalhista


O Compliance Trabalhista possui a premissa de estar em conformidade com a legislação atinente ao tema, contudo sua abrangência vai além do mero atendimento ao ordenamento jurídico, incluindo adoção de práticas de gestão empresarial ética, sustentabilidade, controle de processos, visão estratégica e promoção da integridade, entre outros. 


A prática do compliance nas relações de trabalho, baseia-se na criação de códigos de ética e adoção de padrão de condutas que permitam o efetivo cumprimento da legislação e normas do Direito do Trabalho. Neste sentido, leciona Rosana Kim Jobim:


“(…) as empresas são resultado de uma ficção jurídica, cujo principal elemento ainda é expresso não pelo conjunto de bens, mas sim, no ser humano, o qual imprime movimento e exercício às coisas corpóreas e incorpóreas. Logo, considerando que o homem é o cerne das relações de trabalho; considerando que a força de trabalho é fundamental para a realização dos fins da empresa; e, por fim, considerando que o compliance é visto como um comportamento de empresa, então diz respeito aos empregadores e a cada um de seus empregados, na medida em que o cumprimento das normas internas e externas deve ser por eles observado. Nessa dinâmica empresarial, as ações tomadas pelos agentes da relação de emprego merecem cada vez mais destaque na área de compliance. Isso decorre não somente de comandos externos (legislação civil, penal e trabalhista), mas também de elementos internos diretamente relacionados com os direitos e deveres dos empregadores e empregados, decorrentes do contrato de trabalho”. (JOBIM, 2018, p. 32)


Ao adotar um Programa de Compliance Trabalhista as empresas devem buscar além de estarem em conformidade com o ordenamento jurídico trabalhista, implementar controles e análises que possibilitam a redução do passivo trabalhista (consequentemente redução do risco do negócio) e o desenvolvimento de treinamentos periódicos, conforme preconiza o Decreto n.º 8.420/2015 que regulamentou a Lei n.º 12.846/2013.


Imperioso asseverar que a adequação (adoção das práticas) ao compliance trabalhista não ocorre somente durante a vigência do contrato do empregado/colaborador/representante, uma vez que para efetividade das práticas é necessário que as medidas sejam adotadas desde o início da análise do edital, passando pela efetiva execução do contrato até a sua conclusão/encerramento.


O artigo 41, do Decreto 8.420/2015 (regulamenta a Lei n.º 12.846/2013) preconiza:


“Para fins do disposto neste Decreto, programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira”.


Saliente-se, para real e adequada mitigação dos riscos trabalhistas, é imprescindível que o Programa de Compliance seja pautado na busca da efetividade, com a busca incessante para sua aplicação.


Cabe ressaltar que a busca da efetividade acima abordada, somente é alcançada com o comprometimento e engajamento dos gestores das empresas e consequentemente com a aplicação prática nas relações com seus empregados, colaboradores e representantes.


Outrossim, temos que a Justiça do Trabalho em algumas decisões recentes tem abordado a necessidade se implementação ou adequação/melhoria dos programas de integridade, sobretudo nos casos de assédio moral.


Desta forma, cabe asseverar que a implementação de Programas de Compliance e integridade em conformidade com o que dispõe a Lei Anticorrupção e o Decreto que regulamenta são fundamentais para aplicação prática da cultura de compliance, a qual certamente irá evoluir a cultura organizacional, melhorar o ambiente de trabalho, diminuir/evitar a prática de atos de corrupção, bem como assegurar a integridade da pessoa jurídica.



Compliance Trabalhista nos contratos com a Administração Pública


A administração pública passou a exigir a implantação do Programa de Compliance para formalização dos contratos públicos.


Ressalte-se, que tal premissa, ainda, não é obrigatória, contudo, poderá ser requisito básico para contratação com o ente público, inclusive com a previsão de sanções que restrinjam a possibilidade de contratação com a administração pública para as empresas que não atenderem os termos previstos na legislação anticorrupção.


Ademais, os Estados e Municípios tem implementado Programa de Compliance, através de legislação própria, sendo o Estado do Rio de Janeiro o primeiro na previsão da obrigatoriedade de Programas de Compliance e regras anticorrupção para a contratação com a Administração Pública.


Neste sentido, temos Estados que trazem a obrigatoriedade da adoção de Programas de Compliance para contratar com o ente público baseado no valor do contrato, sendo que usualmente os contratos com valores inferiores que podem ser contratados junto as pequenas e médias empresas não necessitam da adoção dos programas de integridade.


Outrossim, temos que as premissas, procedimentos e ferramentas do Compliance deverão/devem ser atendidas/cumpridas pelo ente público, o que possibilita o aumento da transparência na execução dos contratos com a Administração Pública.


Logo, podemos asseverar acerca da possibilidade da adoção de Programas de Compliance pelo ente público, sobretudo pela necessidade de fiscalização na execução dos contratos e potenciais riscos (responsabilidade subsidiária nas reclamações trabalhistas) para Administração Pública.



O Compliance no Terceiro Setor


Entendendo o terceiro setor como uma atividade econômica que engloba organizações não governamentais (ONGs), associações, fundações e outras entidades, as quais atuam com finalidades sociais, ambientais, culturais ou de desenvolvimento comunitário, temos evidente a importância do Compliance, haja vista a utilização de recursos públicos, doações privadas e parcerias governamentais, uma vez referida utilização exige transparência e prestação de contas.


Assim, o compliance no terceiro setor, especialmente no âmbito das organizações sociais (O.S.), é de extrema relevância em virtude da crescente exigência de transparência, prestação de contas e conformidade regulatória. As organizações sociais (O.S.) desempenham atividades de interesse público e, muitas vezes, recebem recursos estatais mediante contratos de gestão, termos de parceria ou convênios. 


Logo, imperiosa a necessidade de observância rigorosa a normas legais, regulamentos específicos e boas práticas de governança, a fim de garantir que a aplicação dos recursos e a execução das atividades ocorram de forma lícita, eficiente e ética.


Ademais, no que tange as organizações sociais, a implementação de programas de compliance deve contemplar não apenas aspectos gerais de integridade e controles internos, mas também requisitos específicos decorrentes da legislação aplicável, como por exemplo, os ordenamentos relativos as O.S., MROSC, Improbidade Administrativa e Anticorrupção. Isso inclui a adoção de políticas de integridade, canais de denúncia acessíveis e seguros, procedimentos de due diligence para fornecedores e parceiros, bem como treinamentos periódicos para dirigentes, colaboradores e voluntários. 


Por fim, um programa de compliance efetivo no terceiro setor deve ir além da mera formalidade documental e se traduzir em uma cultura organizacional voltada à integridade, responsabilidade e accountability. No caso das organizações sociais, isso significa criar mecanismos que permitam verificar, de forma contínua, a conformidade com metas e indicadores pactuados com o poder público, ao mesmo tempo em que se assegura a gestão transparente dos recursos. A adoção dessas práticas não apenas fortalece a legitimidade da entidade perante a sociedade e órgãos de controle, mas, sobretudo, contribui para a sustentabilidade institucional, resultando e/ou possibilitando o cumprimento efetivo da missão social da organização.



Conclusão


O compliance trabalhista não pode ser reduzido apenas à fiscalização das condutas das empresas nas relações com seus empregados/representantes, haja vista a necessidade de práticas efetivas que permitam a correta aplicação das normas e princípios trabalhistas, bem como as demais legislações atinentes ao tema, visando a prevenção dos riscos da atividade empresarial, buscando sua atuação ética e em conformidade com a legislação.


Por fim, cabe a reflexão acerca da necessidade da formalização da previsão da obrigação de somente contratar com a Administração Publica a pessoa jurídica que possua (comprovadamente) um Programa de Compliance, haja vista potencial impedimento e restrição a competividade, bem como eventual dificuldade em comprovar a efetividade do programa.


Por Leandro Aparecido Reis Brasil, Advogado Tributarista no Luz e Ferreira Advogados.

Advogado com mais de 15 anos de carreira desenvolvida atuando nas áreas do Direito Civil, Trabalhista, Contratual e Empresarial. Especialista em Direito dos Contratos pela FGV-SP, Pós Graduado em Processo e Direito do Trabalho pelo Mackenzie-SP. Coordenador da Comissão da Igualdade Racial da Subseção da OAB/Barueri. Entusiasta das práticas de metodologia ágeis com formação nas metodologias GTD, SCRUM e KANBAN.



Referências Bibliográficas

ANDRADE, Flávio Carvalho Monteiro de; FERREIRA, Isadora Costa. Compliance trabalhista: Compreendendo a Prevenção de Risco trabalhista por Meio de Programa de Integridade. Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, nº 331, janeiro, 2017.


BRASIL. Decreto Lei nº 5.452: Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 22 de fevereiro de 2021.


BRASIL. Lei ordinária n. 12.846, de 1 de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em 22 de fevereiro de 2021.


BRASIL. Decreto n. 8.420, de 18 de março de 2015. Regulamenta a Lei no 12.846, de 1º de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/decreto/d8420.htm. Acesso em 22 de fevereiro de 2021.


CORREIA, Henrique. Compliance e sua aplicação no direito do trabalho. Revista Ltr: legislação do trabalho, São Paulo, SP, v. 83, n. 1, janeiro, 2019.


JOBIM, Rosana Kim. Compliance e Trabalho: entre o poder diretivo do empregador e os direitos inespecíficos do empregado. Florianópolis, SC: Tirant Lo Blanch, 1º edição,  2018.


LOSINKAS, Paulo Victor Barchi.; FERRO, Murilo Ruiz. Exigência de Compliance nas Licitações e nas Contratações Públicas. In: CARVALHO, André Castro. Manual de Compliance. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

 
 
 

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